Artigos | Postado no dia: 24 fevereiro, 2025

Dívidas do falecido: responsabilidades e consequências legais

O falecimento de uma pessoa gera diversas questões patrimoniais e sucessórias que precisam ser resolvidas, incluindo o destino das dívidas deixadas pelo falecido. Muitas famílias se deparam com a dúvida sobre quem deve arcar com tais obrigações e até que ponto essas dívidas podem afetar a herança e os herdeiros. O ordenamento jurídico brasileiro possui regras claras sobre esse tema, garantindo que as obrigações do falecido sejam respeitadas sem que os herdeiros sejam prejudicados além do permitido por lei. Este artigo explora o tratamento das dívidas após o falecimento do devedor, abordando a responsabilidade do espólio, a extensão da obrigação dos herdeiros, o procedimento de cobrança e as implicações legais da insolvência da herança.

O princípio da responsabilidade limitada do herdeiro, conforme o artigo 1.792 do Código Civil Brasileiro, visa proteger os herdeiros da responsabilidade ilimitada pelas dívidas deixadas pelo falecido. Isso significa que, ao assumir a herança, os herdeiros não ficam obrigados a pagar as dívidas do falecido com seus próprios bens, mas apenas com os bens herdados. Esse princípio se baseia na ideia de que a herança, representada pelo patrimônio deixado, é o limite para a quitação das dívidas. Ou seja, a responsabilidade dos herdeiros é restrita ao valor da herança. Se o valor das dívidas superar o montante dos bens deixados, o saldo restante da dívida será extinto, sem que os herdeiros precisem arcar com o pagamento de valores além da herança recebida.

Se o falecido deixa um patrimônio de R$ 200.000,00 e dívidas de R$ 300.000,00, a responsabilidade dos herdeiros é limitada ao patrimônio de R$ 200.000,00. Os credores só poderão cobrar até esse valor, e a diferença de R$ 100.000,00 será extinta. Os herdeiros, portanto, não terão que pagar essa diferença com seus próprios bens.

O princípio da responsabilidade limitada garante uma certa segurança aos herdeiros, impedindo que eles sejam prejudicados por dívidas que excedam o valor da herança. Esse conceito está relacionado ao fato de que a sucessão é uma transmissão de bens e direitos, mas também de obrigações, que devem ser equilibradas com o valor dos bens deixados, evitando que os herdeiros sejam sobrecarregados.

Após o falecimento, o inventário é o processo legal que tem por objetivo apurar e distribuir os bens, direitos e dívidas deixadas pelo falecido. Durante esse processo, os credores podem se habilitar para cobrar as quantias devidas, respeitando a seguinte ordem de pagamento: despesas com funeral e inventário, dívidas trabalhistas e previdenciárias, impostos e tributos devidos e dívidas com bancos e credores particulares. Se a herança for suficiente, todas as dívidas são quitadas antes da divisão dos bens entre os herdeiros. Caso contrário, os credores receberão de forma proporcional ao que houver de disponibilidade, e o restante das dívidas será extinto. O herdeiro pode se recusar a pagar dívidas do falecido com seu próprio patrimônio. Caso um credor tente cobrar diretamente do herdeiro, este pode contestar a cobrança na Justiça, alegando o princípio da responsabilidade limitada.

As dívidas tributárias seguem uma regra específica. O artigo 131 do Código Tributário Nacional (CTN) estabelece que os herdeiros respondem pelas obrigações tributárias do falecido até o limite do valor da herança. Dessa forma, tributos como IPTU, Imposto de Renda ou ISS devem ser quitados antes da partilha dos bens. Se o falecido possuía um financiamento imobiliário ou veicular, a dívida pode ser quitada pelo seguro prestamista (caso tenha sido contratado). Se não houver seguro, o bem pode ser vendido para pagar a dívida, ou os herdeiros podem continuar pagando as parcelas se desejarem manter o bem. Se o falecido era fiador de um contrato de aluguel, a responsabilidade pode ser transferida ao espólio e, em alguns casos, aos herdeiros, dependendo da cláusula contratual. O Supremo Tribunal Federal (STF) entende que a fiança pode ser transmitida aos herdeiros se o contrato assim prever.

Quando o falecido deixa mais dívidas do que bens, ocorre a chamada insolvência do espólio. Nesse caso, os credores podem requerer a abertura de um processo específico para a liquidação dos bens deixados, chamado concurso de credores. Esse processo segue um critério de prioridade semelhante ao da cobrança de dívidas no inventário, e o saldo remanescente das dívidas é perdoado, não podendo ser cobrado dos herdeiros.

Embora os herdeiros não precisem pagar as dívidas com seus próprios recursos, a existência de débitos pode atrasar a partilha da herança e gerar complicações legais. Algumas medidas preventivas incluem manter um controle financeiro rigoroso e evitar dívidas excessivas, contratar seguros de vida para cobrir eventuais dívidas em caso de falecimento, consultar um advogado ou contador para planejar a sucessão patrimonial e verificar a existência de seguro prestamista em financiamentos.

As dívidas do falecido devem ser quitadas com os bens deixados, respeitando a prioridade dos credores no processo de inventário. Os herdeiros não podem ser obrigados a pagar as dívidas com seu próprio patrimônio, a menos que tenham se tornado coobrigados por meio de aval, fiança ou dívidas solidárias. Compreender essas regras é essencial para evitar abusos por parte de credores e garantir que o processo de sucessão ocorra de maneira justa e conforme a lei. Caso haja dúvidas ou situações específicas que necessitem de esclarecimento, é recomendável buscar assessoria jurídica especializada. A boa gestão patrimonial e o planejamento sucessório são medidas essenciais para minimizar impactos negativos sobre os herdeiros e garantir um processo de transmissão de bens mais tranquilo e seguro.